sábado, 13 de julho de 2013

Cren-dós-padre - Descortinando Cornélio Pires (escritor)



Meia noite na porta do cemitério.

Cren-dós-padre de atravessá o cemitério agora Zé.
Ocê que é besta sô, vamu logo Toin!
Mais Zé, hoje é dia de finadu, eles tão tudo sorto aí dentro.
Ocê carece de sê mais home Toin, além dos mais, eu tenho o corpo fechado.
Avai, tem mesmo?
Craro ué, tá vendo argum buraco aqui, só da cara, osotro que tem os pano tapa.
Deixa de sê besta homi, ainda fica zuando, agora que num vô mesmo,
Então fica aí, quando ocê chegá eu já to dormindo é tempo.
Vai cum Deuso e Nosso Sinhô Jesus Cristo, inté!
Tá, tá, tá, tá, inté. Diz Zé sem nem olhar apara trás.

Já no meio do cemitério

Esse Toin parece criança, acreditando em sombração.
Comé quié amigo?
Ô qui bão encontrá mais arguém aqui, o povo morre di medo, vê si pode.
Pois é, não sei porquê.
São tudo caipira sô, isso é culpa dos mai véi, botando caraminhola na cabeça do povo.
Será amigo? Eu sou bem mais velho que você.
Ué e não tem medo di passá pelo cimitério essas hora.
Quando eu era vivo tinha!
Cren-dós-padre, mi acuda Nosso Sinhô!!!!

Zé deu no pé e nunca mais duvidou de nada nessa vida.

Se é verdade eu num sei, mas foi assim que minha vó contou.

Joakim Antonio


“Meio escritor, meio ator, meio animador; generoso, combativo, empreendedor, simpático – a sua maior obra foi a ação nos palcos nas palestras na literatura falada que perde bastante quando é lida. Como os oradores, como certo tipo de poetas, como os repentistas e os velhos glosadores de mote, a dele foi uma literatura de ação e comunhão direta, eletrizante, com o público”.  Dantas, M., Cornélio Pires Criação e Riso - ed. Duas Cidades. Prefácio de Antonio Candido¹





Cornélio Pires (Tietê, 13 de julho de 1884 — São Paulo, 17 de fevereiro de 1958) foi um jornalista, escritor, folclorista e espírita brasileiro.

Foi um importante etnógrafo da cultura caipira e do dialeto caipira.


Iniciou a sua carreira viajando pelas cidades do interior do estado de São Paulo e outros, como humorista caipira.

Em 1910, Cornélio Pires, apresentou no Colégio Mackenzie hoje Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, um espetáculo que reuniu catireiros, cururueiros, e duplas de cantadores do interior. O Colégio Mackenzie foi fundado e sempre mantido pela Igreja Presbiteriana, à qual Cornélio Pires pertencia.
Ambicionando cursar a Faculdade de Farmácia, deslocou-se de Tietê para a cidade de São Paulo, a fim de prestar concurso de admissão. Não tendo obtido sucesso em seu intento, conseguiu empregar-se na redação do jornal O Comércio de São Paulo. Posteriormente trabalhou no jornal O Estado de S. Paulo, onde desempenhou a função de revisor. A partir de 1914, passou a trabalhar no periódico O Pirralho.

Foi autor de mais de vinte livros, nos quais procurou registrar o vocabulário, as músicas, os termos e expressões usadas pelos caipiras. No livro "Conversas ao Pé do Fogo", Cornélio Pires faz uma descrição detalhada dos diversos tipos de caipiras e, ainda no mesmo livro, ele publica o seu "Dicionário do Caipira". Na obra "Sambas e Cateretês" recolhe inúmeras letras de composições populares, muitas das quais hoje teriam caído no esquecimento se não tivessem sido registradas nesse livro. A importância de sua pesquisa começa a ser reconhecida nos meios acadêmicos no uso e nas citações que de sua obra faz Antonio Candido, professor na Universidade de São Paulo, o nosso maior estudioso da sociedade e da cultura caipira, especialmente no livro Os Parceiros do Rio Bonito.

Foi o primeiro a conseguir que a indústria fonográfica brasileira lançasse, em 1928, em discos de 78 Rpm, a música caipira. Segundo José de Souza Martins, Cornélio Pires foi o criador da música sertaneja, mediante a adaptação da música caipira ao formato fonográfico e à natureza do espetáculo circense, já que a música caipira é originalmente música litúrgica do catolicismo popular, presente nas folias do Divino, no cateretê e na catira (dança ritual indígena, durante muito tempo vedada às mulheres, catolicizada no século XVI pelos padres jesuítas), no cururu (dança indígena que os missionários transformaram na dança de Santa Cruz, ainda hoje dançada no terreiro da igreja da Aldeia de Carapicuíba, em São Paulo, por descendentes dos antigos índios aldeados, nos primeiros dias de maio, na Festa da Santa Cruz, a mais caipira das festas rurais de São Paulo).

A criação de Cornélio Pires permitiu à nascente música caipira comercial, que chegou aos discos 78rpm libertar-se da antiga música caipira original, ganhar vida própria e diversificar seu estilo. Atualmente a música caipira é chamada de música raiz para se diferenciar da música sertaneja. A música caipira dos discos 78rpm nasce, no final da década de 1920, como o último episódio de afirmação de uma identidade paulista após a abolição da escravatura, em 1888, que teve seu primeiro grande episódio na pintura, especialmente a do Ituano Almeida Júnior, expressa em obras como "Caipira picando fumo", "Amolação interrompida", dentre outras. A ironia e a crítica social da música sertaneja originalmente proposta por Cornélio Pires, situa-se na formação do nosso pensamento conservador, que se difundiu como crítica da modernidade urbana. O melhor exemplo disso é a "Moda do bonde camarão", uma das primeiras músicas sertanejas e uma ferina ironia sobre o mundo moderno.

Após encerrar a sua carreira jornalística, Cornélio Pires organizou o "Teatro Ambulante Cornélio Pires", viajando com o mesmo de cidade em cidade, aplaudido por onde passava.

Cornélio Pires é primo dos escritores Elsie Lessa, Orígenes Lessa, Ivan Lessa, Juliana Foster e Sergio Pinheiro Lopes. WIKI

1. Retirado do artigo AS AVENTURAS DE CORNÉLIO PIRES de Arlete Fonseca de Andrade em PUCSP

Para saber mais:

  • O Paratodos colocou o pé na estrada e foi até Tietê, no interior de São Paulo, conhecer o trabalho de um pesquisador que dedicou boa parte de sua vida à cultura caipira: o jornalista, escritor e folclorista Cornélio Pires em  Youtube.com 
  • Cornélio Pires, uma canturia e um causo divertido, num curto vídeo em YouTube.com  




Imagem: Hi-Speed-Quadrilha by Roobens

Um comentário:

  1. Não conhecia, aliás, sei tão pouco dos escritores brasileiros. grata por esse olhar meu caro.
    bacio

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"Quando escrevo minhas idéias tornam-se a pena e minha alma a tinta, por isso quando você lê, você me sente."

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